terça-feira, 3 de agosto de 2010

Onde foi parar a cozinha paulista? Em Minas Gerais!


Por Josimar Melo
Fotos Tuca Reinés

A cozinha brasileira está finalmente sendo mais valorizada. E quando falamos nela, a primeira coisa em que pensamos é nas cozinhas regionais – como a mineira e a baiana. Mas como fica o maior Estado do país? A cozinha paulista existe?

Segundo a pesquisadora Rosa Belluzzo, existe sim. É uma fusão da cozinha indígena com a portuguesa, uma cozinha dos bandeirantes, que se embrenhavam pelos sertões com os indígenas e caçavam, coletavam os frutos e faziam a comida. Plantavam milho e feijão para colher na volta das suas explorações. O uso do milho era típico da região, enquanto no nordeste prevalecia a mandioca. Segundo Belluzzo, os indígenas faziam mingau de milho, que se transformou em curau, e a paçoca de carne era comida típica bandeirante, pois eles levavam a farinha, fácil de transportar, e misturavam com a carne seca. O virado à paulista também era de fácil transporte – tanto o feijão quanto a farinha. Autora do livro “São Paulo – Memória e Sabor”, ela diz que esta cozinha paulista foi empurrada para debaixo do tapete por ser muito simples e pela forte influência dos imigrantes e a internacionalização do paladar em São Paulo. E acrescenta que ela sobreviveu em Minas Gerais, região cuja cozinha na origem é paulista – pois Minas foi desbravada pelos bandeirantes, que levaram seus hábitos culinários para a região. Ricardo Maranhão, professor de História da Gastronomia na Universidade Anhembi Morumbi, acrescenta que a cozinha dos bandeirantes tinha dois princípios básicos: ser nutritiva e de fácil transporte. Segundo ele, a criação de porcos fornecia torresmos e alimentos à base de banha; a farinha de mandioca, a partir do século XVI, e a de milho, a partir do século XVIII, também eram base dessa culinária. Para acompanhar, eram feitas leguminosas quentes como milho e feijão.

Dos pratos levados pelos paulistas a Minas na época da exploração do ouro, constituindo o que hoje conhecemos como cozinha mineira, só não foi o cuscuz paulista, prato simbólico de São Paulo nascido do farnel de lenço – mistura de farinhas de mandioca e milho com carnes que os bandeirantes envolviam no lenço ou bornal.

Segundo o professor, outro diferencial da culinária paulistana foi a presença dos peixes de rio, até que os rios morressem na cidade com a industrialização que, por seu lado, coincidiu com o enraizamento do hábito italiano de comer carne cozida com massa, algo que logo se tornou um costume paulistano.

No século XX, a forte presença dos restaurantes fez com que eles começassem a ditar o que era a comida de São Paulo, dominada pela pizza e pelo macarrão, mas também marcada pela representação de todo o Brasil e do mundo (comida francesa, árabe, japonesa, gaúcha...).

Maranhão resume dizendo que a comida paulista original, que ainda hoje se come principalmente no interior, perdeu a força com a entrada dos imigrantes, e pela dinâmica social de São Paulo que, nos últimos 70 anos, tendeu a valorizar apenas o que é moderno, internacional. O resultado é uma culinária paulistana multirregional, aberta a todas as influências, rica, em constante transformação.

Matéria publicada da segunda edição do Flavour Guide - Lugares Especiais, Sabores Únicos (BBD Editora)

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